Em torno do Futebol, o esporte mais popular do planeta, desde o seu surgimento no final do século XIX até agora vários tópicos foram agregados.
Aristocrático, e por isso racista; de massa; violento, principalmente por causa dos torcedores; e negócios são elementos indissociáveis da história do universo boleiro. Porém é a paixão lúdica que logo vem à mente, através das suas cores, distintivos, lugares de origem, forma de jogar, os pretextos para escolher o clube de coração estão entre as expressões mais inusitadas de carinho.
A cada dia mais comercial, “profissional” – diriam os marqueteiros -, camisas e flâmulas foram deixando de ser itens daqueles que sabem desenhar, têm uma boa impressão e saíam a ganhar a vida com o talento no traço e paixões da torcida. Até vir o licenciamento e se transformar em mais uma fonte de renda do time, e gastos maiores para o bolso da turma da arquibancada.
Na crescente importância em tantas áreas, o Futebol, ali pelos anos 70, teve o acréscimo das torcidas uniformizadas, depois ganharam a companhia das organizadas, e a violência que ficava entre vizinhos, no máximo, tomou as ruas e protagoniza batalhas campais homéricas. Hooligans, barras bravas, as nomenclaturas revelam o teor da prática de uma pequena, proporcionalmente aos milhões de torcedores que dispõem cada clube, mas numerosa turma que dissemina a agressão como bandeira literal de luta. Hoje, chegam a ter o tratamento ‘vip’ de saírem das suas sedes até os estádio com escolta, fato que não acontece com o fanático comum, que sai com a família para vibrar nas partidas do time do coração.
De passagem pelo Rio Grande do Sul, não é difícil surgir uma interrogação: como é possível encontrar tantas lojas oficiais de Grêmio e Inter, que, numericamente, polarizam os estádios gaúchos, lado a lado? O curioso também não entenderá que podem ser ou do mesmo dono, ou se não for, coexistem na maior naturalidade. Será que em clássicos o cenário na terra do Laçador é diferente, os torcedores trocam flores e outros afagos? Não, o forte esquema de segurança é o mesmo que nas grandes rivalidades brasileiras, mas em tempos de marketing, as cifras fazem mais efeito que os cassetetes.
Em face do tamanho questionamento, o Lado D passou num desses pares inusitados e conversou com um responsável das franquias rubro-azulinas. Em São Leopoldo, numa galeria no centro da cidade, Grêmio Mania e Inter Sport, ambas na Rua Independência, estão parede a parede e sob a mesma gerência. Anderson Schenkel, responsável pelas duas, digamos, seria uma espécie de “juiz de paz” que mostra como a rivalidade tem limite, e não apenas no caso romântico de marido e mulher, pai e filho, entre outros.
Os detalhes como produtos campeões de venda, a forma de conseguir representar as franquias, hábitos dos consumidores/torcedores, ilustram várias curiosidades envolventes, as quais apesar do viés econômico, mostram o marketing destacado, inclusive em âmbito nacional, dos clubes mais populosos do Extremo Sul.
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Lado D dos Esportes As duas lojas juntas em vários locais do Estado é uma medida que existe de forma ocasional?
Anderson Schenkel É um marketing estratégico, pois a maioria dos casais tem um que é gremista e outro que é colorado, é difícil a família ser de um time só. Geralmente, sempre tem alguém que é do outro lado, e em época de dar presente fica mais fácil, um vem aqui, depois vai ali.
LDE É um caso único no país?
AS Não sei, em SP mesmo, Poderoso Timão tem só Corinthians, é separada de lojas de outros times, não funciona assim.
LDE Existem as separadas ou sempre são juntas?
AS Acontece de ter separadas, no caso, eu tinha a loja em Santa Maria que era a Inter Sport, não era a Grêmio Mania, pois já pertencia a outras pessoas, em outros pontos e não necessariamente uma do lado da outra. E aqui na região (metropolitana), todas são uma ao lado da outra, com exceção das do Beira-Rio e do Olímpico.
LDE Elas existem só aqui no Estado ou têm em outros, ao menos em Florianópolis?
AS É mais aqui, tem alguns clientes que vem, no caso, de Santa Catarina, de fora, que até falam que lá não tem, é mais difícil de chegar o produto lá, geralmente nas lojas de esportes têm, mas não uma franquia da dupla Gre-Nal.
LDE Como é que é feito o processo para chegar a abrir uma loja?
AS A franquia é totalmente com o marketing.
LDE Não existe uma obrigação de ser gremista para a Grêmio Mania, e colorado para a Inter Sport?
AS Não, não, basta querer abrir e ver se há disponibilidade da franquia naquela cidade. Existe uma cota de franquias por cidade, conforme a população.
LDE Você sabe o número populacional exigido para isso?
AS Não sei dizer, mas talvez em torno de 100 mil, mais ou menos.
LDE A pessoa pode ser responsável pelas duas ou é proibido?
AS Não, pode ser qualquer um, desde que tenha o capital de abertura que vão exigir como garantia.
LDE O interessado pode abrir em outros estados?
AS Pode, claro, desde que converse com o clube não tem problema nenhum.
LDE É estranho que não existam em mais estados, pois como no Centro-Oeste, no Norte, têm muitos gaúchos e, de repente, alguém poderia ter ousado levar para lá…
AS Mas não teria a demanda dos dias de jogo, que é maior, quando ganha um campeonato é maior, então, varia muito, e lá não teria isso. Porque aqui tem o dia de jogo, o pessoal passa e compra no Olímpico, no Beira-Rio, é mais rivalidade mesmo, por isso que existe bastante franquia aqui.
LDE Existe uma versão virtual assim, com elas juntas?
AS Não, existe a versão virtual, mas separadas. A Grêmio Mania pertence ao Grêmio mesmo, e a do Inter pertence à Netshoes, uma loja de São Paulo, então, todos os produtos adquiridos pelo site do Inter vêm diretamente de SP, e os produtos do Grêmio vêm diretamente da loja do Olímpico. Não são lojas divididas ao meio para os dois, são totalmente diferentes. Se eu quiser fazer um site da minha loja de São Leopoldo, eu não posso!
LDE E o tipo de material que mais vende, nas estatísticas?
AS Então, o que é que mais vende? Vende mais quem está no momento melhor! Por incrível que pareça, um tá mal, o outro tá melhor, vende mais quem tiver melhor, no mais é parelho. Sai um uniforme novo de um, vende mais naquele mês, depois sai o uniforme do outro, sai mais, então, não tem como dizer esse vende mais que o outro. Ultimamente, o Inter ganhou mais títulos e vende muito mais pelo menos nos últimos três anos.
LDE Mas esse muito mais é o quê?
AS Na época que ganha os títulos, chega a ser 70% a mais, agora os dois não ganhando nada, fica mais ou menos parelho, um vende 10% a mais num mês, o outro vende 10% a mais no seguinte. Varia também de acordo com o jogo, por diária, no dia que é o jogo de um, no dia que é o jogo do outro.
Varia muito mais com um título, ou, não sei te dizer a palavra, mas a desgraça do outro também! O Inter, por exemplo, perdeu o Mundial pro Mazembe e o Grêmio vendeu um horror, mesmo não ganhando nada! Então a desgraça do outro também ajuda, eu acho impressionante! Um pouco antes do jogo contra o Mazembe, o Inter vendia muito mais que o Grêmio, estava vendendo uns 50% a mais, aí quando o Inter perdeu, o Grêmio é que vendeu 50% a mais!
LDE Mas em peças, quais as que vendem mais?
AS Vende mais as camisa de manga curta, de jogo, mesmo no inverno mais rigoroso, é a que mais sai. Nada vence a camisa, o pessoal é tradicional mesmo.
LDE E as camisas da onda retrô, conseguem sair mais que a beleza delas?
AS A camisa retrô tem uma saída considerável, não chega a ser como uma de jogo, mas sai bem. Sempre saem, até porque a intenção da franquia é chegar aqui e não sair sem um presente, essa é uma estratégia, tem que ter de tudo um pouco.
LDE Os dvds, em época de pirataria, como eles ficam?
AS Os dvds vendem bem, a pirataria até não atrapalha muito os clubes, o pessoal prefere comprar o oficial, que nem o Inter, lançou o dvd da torcida, da Guarda Popular, e a torcida prefere comprar o original do que o pirata, até então não vi o pirata rolando. O cd da Guarda é o cd que mais sai, o dvd da Guarda sai tanto quanto sai o de campeão mundial do Inter, ou o “Nada Vai Nos Separar”, esses de história geralmente saem mais que o da torcida, até porque, primeiramente, o da torcida não são cânticos no dvd, tem declaração de jogador e vai ver um jogo pela Sul-Americana, quando o Inter foi campeão em La Bombonera.
Com os dvds do Grêmio são a mesma coisa. O Grêmio não tem cd da torcida, tem dvd dos 100 anos e a Batalha dos Aflitos, além do Mundial de 1983, que foi feito recentemente.
LDE Essa proposta da Grêmio Mania e Inter Sports existe desde quando?
AS Eu não sei te dizer, mas veio crescer quando o Inter começou a ganhar a Libertadores, e começaram a crescer os dois. O pessoal achou estratégico fazer os dois, quando o Inter foi campeão mundial, começaram a surgir muitas Inter Sport e Grêmio Mania no estado. Não é que juntas sejam uma proposta dos clubes, a proposta é do proprietário, do investidor, porque não quer dizer que tu não possa abrir só um Grêmio, só um Inter, mas pensando no lado estratégico, não é vantagem abrir só um e deixar para um próximo que tenha o olho no nicho de mercado.
LDE Os produtos ‘diversos’, tipo chaveiros, canetas, saem mais?
AS É que chaveiro, como lembrança, sempre sai mais, os acessórios em geral saem bem: chaveiros, óbvio, canetas, canecas, copos… Com certeza, chaveiros vendem mais que uma camiseta, as canetas saem como os chaveiros, existem diversos produtos que saem bem.
LDE Qual a periodicidade para se ter um item novo?
AS A camisa chega a ter duas vezes por ano, mas sempre tem uma novidade. Um chaveiro novo, uma caneca de emblema diferente…
LDE Aqueles casos do time perder e sofrer alguma violação nas lojas, tipo, serem incendiadas, acontecem por aqui?
AS Aqui, a princípio, nunca aconteceu nada, graças a Deus. Pelo menos não fui informado.
LDE As peças são mais vendidas em espaços como esse ou nos estádios?
AS Ah, com certeza no estádio, dia de jogo o movimento é absurdo dentro das lojas, tu não consegue entrar direito em dia de jogo grande, dependendo do título que o time ganha, os produtos chegam de caminhão e vende muito, muito, muito mesmo.
LDE Existem ações de algum jogador vir até aqui, não necessariamente nestas duas, mas em alguma outra?
AS Existem, em Santa Maria, quando eu tinha a loja do Inter lá, o Fernando Carvalho veio na loja autografar quando lançou o livro dele, numa festa do Consulado do Inter, o evento foi lá na loja. Eles fazem essa campanha de marketing, sim. Aqui, necessariamente, não veio ninguém do Inter ou do Grêmio. Com as nossas lojas, acontece de ter festa do Consulado, no caso, do Grêmio, e a gente vai colocar a loja lá, vão vir jogadores do Grêmio. Sempre rola, desde que venha o convite da Confraria do Saci ou do Consulado, ou a gente indo atrás dos eventos para participar também.
LDE Pra finalizar, voltando ao tema pirataria, vocês participam de medidas contra a pirataria dos produtos, não só dos dvds, mas de camisas etc.?
AS Fica mais para os clubes investigarem isso que nós, até porque eles fizeram uma campanha e recolheram produtos de várias lojas de piratas, fizeram doações dessas camisetas e distribuíram entre crianças carentes, não é nada com a gente.
por Ricardo S.
Imagem: Reprodução/www
Publicado em 02.05.2012