La Marca #2

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Da várzea ao ouro olímpico

Quando marcas esportivas são o assunto, especificamente as que vestem os atletas de modalidades de alto impacto, é difícil não virem à mente os nomes de várias delas. Na maioria, são marcas-fantasia transnacionais, desterritorializadas e dotadas de encantamento ante o consumidor, características que percorrem o mundo a partir das políticas de globalização político-econômica.

Elas estão nos comerciais de tv, no tênis do colégio, na camisa dos jogadores que povoam o imaginário da torcida, chegam até mesmo a fazer parte de linhas de relógios, óculos, desodorantes, enfim, uma goleada publicitária ávida por mercados e consumidores. Só que todo este poderio econômico teve o seu dia de início, que como tal, precisou disputar palmo a palmo cada loja da cidade onde nasceu, do estado, do país, patrocinar ao menos um atleta, estampar um outdoor.

Nesta fase incipiente, é desafiador sair juntando cada peça do quebra-cabeças comercial, quem ficou pelo caminho ou permanece na batalha, com quais instrumentos os resultados são desdobrados. A possibilidade de conhecer a Dresch Sport, empresa criada em 1986 por Luis Dresch, em São Leopoldo (RS), ilustra bastante este processo.

A entrevista concedida por Diego Dresch, filho do fundador da marca, mostra como uma ideia que, de tão simples, poderia ser apenas mais um meio de subsistência, como é a origem de quase todo trabalho. No entanto, se passar desta fase, sem dúvida revela a engrenagem não apenas da hipotética “pequena marca do interior”, mas amplifica a visão e traduz as relações comerciais e empregatícias que já viraram livros, caso de ‘Sem logo’, de Naomi Klein.

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A_Luzerna_Falas Lado D dos Esportes Então, Diego, quando começa a atividade da Dresch?

A_Luzerna_Falas Diego Dresch Em 1986! É uma empresa familiar. O meu pai tinha uma fruteira, e dela ele teve um lucrinho bom e resolveu mudar de ramo, abrir uma empresa de confecção. Foi o primeiro vendedor, pegou a maletinha e foi tirar pedidos, teve sucesso naquele dia e resolveu começar a confecção.

A_Luzerna_Falas LDE Já era ligada ao esporte?

A_Luzerna_Falas DD Era mais destinado a empresas que queriam fazer roupas para os funcionários – agasalhos, camisetas -, naquela época não trabalhava com uniformes esportivos. A ligação com esses materiais de futebol vem de uns 10 anos para cá.

A_Luzerna_Falas LDE À época havia algum fornecedor desses materiais antes de vocês?

A_Luzerna_Falas DD Tinha um fornecedor aqui na região, que existe até hoje, naquela época era um dos únicos voltados para material esportivo por aqui. É da cidade de Novo Hamburgo. Provavelmente, era quem fornecia para os clubes da região, e nós produzíamos abrigos e camisetas de passeio.

A_Luzerna_Falas LDE Ainda existe?

A_Luzerna_Falas DD Existe, no caso, hoje é nosso concorrente. Há uns anos nós tínhamos uma parceria, produzíamos só material de inverno, e eles produziam só fardamento. Nós indicávamos para eles o pessoal que queria comprar fardamentos, e quem queria os abrigos e materiais de inverno, eles indicavam para nós.

A_Luzerna_Falas LDE Vocês ficaram restritos a essa linha durante quanto tempo?

A_Luzerna_Falas DD Acredito que uns 15 anos. Não eram produzidos os fardamentos nos primeiros 15 anos, depois, com a tecnologia, a gente foi descobrindo máquinas, tudo que poderia capacitar a nossa produção para esse tipo de produto.

A_Luzerna_Falas LDE Ela surgiu já com o nome Dresch Sport?

A_Luzerna_Falas DD O primeiro nome dela era ‘Ti-Ti-Ti’, que tinha uma novela na época e aí surgiu a ideia de colocar esse nome, mas nem tinha logomarca. Foi bem no começo, logo virou Dresch Sport, e ainda com os abrigos.

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A_Luzerna_Falas LDE Aquele logotipo que consta com o nome da empresa com surf veio no intervalo da troca de nomes?

A_Luzerna_Falas DD Não, foi mais pelo logotipo, se for ver, tem uma pessoa segurando uma prancha, que lembra um surfista e era Dresch Surf. Na época, tinha bermudão colorido, alguma coisa assim, produzia camiseta com estampa de surf, mas não era esse o foco. O foco sempre foi ligado às empresas, fazer material para os funcionários, e como eu te disse, de uns 10 anos para cá, o pessoal começou muito a procurar fardamento, e a gente não produzia isso.

A_Luzerna_Falas LDE Mesmo sabendo que não trabalhavam com isso?

A_Luzerna_Falas DD Exatamente. Procuravam alguém em São Leopoldo que produzisse, e a gente viu uma oportunidade de ingressar aí. Começou vendendo de pouco em pouco, quando fomos ver, tomou uma proporção maior.

A_Luzerna_Falas LDE Esse pouco a pouco quer dizer que eram os clubes da várzea que procuravam?

A_Luzerna_Falas DD Sim, as pessoas nos procuravam, a gente produzia para eles, e vamos supor, a parceria com a Dal Ponte deve ter uns oito anos, entramos com ela na parceria e os clubes grandes nos conheceram também. Pela parceria com a Dal Ponte e com os próprios clubes da várzea.

A_Luzerna_Falas LDE Até aí não tinham vínculos com clubes profissionais?

A_Luzerna_Falas DD Não, e hoje os clubes que usam são poucos, seria o caso do (Clube Esportivo) Aimoré e do Esporte Clube Novo Hamburgo, os dois profissionais atualmente usando a marca. Tem diversos clubes profissionais usando o nosso uniforme, só que com outra marca esportiva, como é o caso da Dal Ponte.

A_Luzerna_Falas LDE Outras mais?

A_Luzerna_Falas DD A Olympikus, mas com ela é a parte de vôlei, a Seleção Brasileira de Vôlei. O Flamengo, do Rio de Janeiro, não fazemos o fardamento, mas material de inverno a gente faz bastante para ele, como abrigos de moleton, parca. As grandes marcas terceirizam toda a produção, então, vamos supor, aqui no Rio Grande do Sul, com a Dresch, eles fazem material de inverno, lá na Bahia fazem o fardamento, tudo com marca Olympikus, tudo com o padrão Olympikus. Então, hoje a gente vende um produto com a nossa marca e aluga a nossa produção para outras.

A_Luzerna_Falas LDE Uma vez, conversando com o pessoal de uma loja da Lupo, falaram que a Lupo fornece algumas peças para a Reebok, acho que com a Nike também, na linha de meiões, como vocês, cada um com a sua especialidade.

A_Luzerna_Falas DD É assim mesmo. Antes, quando a Reebok patrocinava o Inter, era possível comprar a meia do Inter com a Reebok, mas vinha na embalagem da Lupo, pois era a Lupo que produzia realmente para a Reebok.

A_Luzerna_Falas LDE Mas é na ligação com a turma do futebol amador que sempre fortalece as marcas no início?

A_Luzerna_Falas DD É, fortalece, acredito que começa pelo pequeno, sempre, e é aquela questão, o marketing mais forte é o de boca em boca, falando um para o outro, daí começaram a vir e hoje temos um público bem legal no futebol amador.

A_Luzerna_Falas LDE Do momento com eles vocês criaram algo como “Taça Dresch”, um tipo de presença mais forte junto a esses times?

A_Luzerna_Falas DD Nós fizemos uma vez a “Copa Dresch”, mas só com quatro clubes que jogam no profissional do Futsal, faz uns seis anos, mais ou menos. Na época, tinha um clube daqui de São Leopoldo, o GuSch, do Colégio Gustavo Schreiber, que tinha um time profissional de Futsal, que hoje não existe mais. Então, jogaram GuSch, o time da Ulbra/Canoas (RS), o Três Coroas (RS) e a Seleção de São Leopoldo – pegaram os melhores jogadores de vários times amadores da cidade e montaram a seleção para disputar.

Em algumas outras ocasiões, a gente entrou como patrocinador de campeonatos, mas não “o Campeonato Dresch Sport”. A ligação mais forte com os clubes amadores, para falar uma data, vem de uns seis anos para cá, que é desde que temos a loja aqui no Centro. Antes o atendimento era só na fábrica, e ela é afastada do Centro, por isso a marca não era muito conhecida ainda.

A_Luzerna_Falas LDE A proximidade chega a ser transformada em melhores preços, alguma vantagem?

A_Luzerna_Falas DD Com certeza, aquele cliente que compra mais com a gente vai ter uma melhor forma de pagamento, um preço melhor no produto, mas hoje a ideia é agregar valor ao nosso produto, porque a gente trabalha forte na qualidade. Mas, dependendo do cliente, tem uma variação de preço, sim.

A_Luzerna_Falas LDE Como você observa esse encantamento da marca, por exemplo, o cara compra um material com a mesma tecnologia e com o símbolo da Dresch por um valor, aí coloca o logo da Olympikus e, possivelmente, duplica? Como é esse raciocínio quando fornece para outras e também pensa em estabelecer a própria marca?

A_Luzerna_Falas DD Isso é um item muito importante porque hoje marca é marca, sabe que comprar uma chuteira da Penalty vai estar pagando um valor, se comprar uma marca brasileira como a Topper, será outro valor. Querendo ou não, as duas são marcas conhecidas mas tem essa diferença.

Acho que hoje a gente não consegue agregar um valor mais alto à marca porque não implantou com o lojista. Temos um projeto de implantar e não só com fardamentos de futebol, mas com camisetas, abrigos, vender para uma Centauro, Paquetá Sports, entendeu, então o pessoal vai começar a conhecer nossa marca, e quem sabe um dia a gente possa cobrar o preço da marca, e não do produto. Hoje, para as grandes, paga mais a marca que o produto.

A_Luzerna_Falas LDE Certas marcas pagam valores exorbitantes para mudar o fornecimento de grandes clubes, tipo era Adidas e muda para a Nike. Com uma Dresch, digamos, com ‘menos encantamento’, rolam essas quantias, não diria exorbitantes, mas de pagar e patrocinar determinado clube?

A_Luzerna_Falas DD Das marcas grandes eu não sei como funciona, é outro mundo, mas o esquema da Dal Ponte ou o nosso é patrocínio em material, não envolve dinheiro. Um exemplo como a Dal Ponte, fornece fardamento, kit de viagem, tênis, bola, tudo que precisam de material esportivo, porque para o clube vale a pena esse tipo de patrocínio, eles têm outros patrocínios que dão em dinheiro. Vamos pegar a ACBF, de Carlos Barbosa (RS), é um time que nós produzimos para ele, mas quem patrocina é a Penalty, a Sicredi e a Tramontina, o fornecedor de material esportivo hoje é a Penalty, só que é fabricado com a Dresch.

A_Luzerna_Falas LDE Olhe aí, você não me falou sobre a ligação com a Penalty!

A_Luzerna_Falas DD Não, a Dal Ponte é que solicita para nós o pedido da ACBF, a Penalty faz uma autorização para a Dresch poder produzir, mesmo que hoje a Penalty tenha fabricação própria.

A_Luzerna_Falas LDE E o que a impede de produzir?

A_Luzerna_Falas DD Aí é aquela jogada de patrocínio, provavelmente eles dão uma cota, sei lá, 50 mil em material, e no momento que acabou aquela cota, a ACBF tem que fazer por conta, então todo ano a ACBF nos procura, nos manda uma mostra da camisa da Penalty e produz com a gente. Claro, aqueles 50 mil que o time recebeu em material da Penalty é a parte da Penalty em patrocínio de material, aí tem a Tramontina e a Sicredi que provavelmente botam dinheiro.

A_Luzerna_Falas LDE Eles terceirizam.

A_Luzerna_Falas DD Isso, mas com a Dal Ponte e a Dresch é só material, claro, que lá dentro a gente paga para colocar uma placa, mas é outro assunto.

A_Luzerna_Falas LDE Pois é, sabendo desse emaranhado e como se faz para crescer enquanto marca, é complicado imaginar como as grandes colocam tanto dinheiro em jogo. Você tem uma ideia de como movimentam tanta grana para pagar a um time?

A_Luzerna_Falas DD Vou dizer o meu ponto de vista: essas marcas estão no mundo inteiro, então uma Nike não teria necessidade de patrocinar nenhum clube em questão de marketing, todo mundo tem um tênis da Nike, uma camiseta, já procura a marca. Eu acredito que elas tenham esse poder todo através da venda dos produtos, é muito volume, por isso que tem essa verba para patrocinar um clube.

A_Luzerna_Falas LDE Assim como divulgam que, por exemplo, uma Nike tem fabricação de produtos na China, e até mesmo a Olympikus com a Dresch, mas lá tem acusação de trabalho escravo, por vezes escravo e infantil. A busca por barateamento, inclusive com a terceirização, também contribui para agregar patrocínios assim, não?

A_Luzerna_Falas DD As grandes marcas tem terceirizações no mundo inteiro, vamos pegar o caso da Olympikus, brasileira. Digamos que tenha representante em cada Estado, então o cara tem o contato dessas empresas, procura uma outra que disponha de qualidade, da qualidade deles e que tenha um preço baixo, porque as marcas grandes espremem os preços até o último centavo, daí eu posso estar concorrendo com uma empresa da Bahia ou do Maranhão, e se ela tiver produto melhor e preço melhor, vão produzir por lá. É sempre uma questão de negociação.

A_Luzerna_Falas LDE Faz lembrar, por exemplo, da Copa do Brasil, onde os preconceitos afloram, se um time lá do Maranhão tiver Kanxa e o Palmeiras a Adidas, de repente, é a Kanxa que faz o material da Adidas.

A_Luzerna_Falas DD Pode acontecer! Hoje vai ter um jogo de Futsal entre os dois melhores times de Futsal do Brasil na atualidade, que é a ACBF com a Penalty, fabricado pela Dresch, e o Intelli/Orlândia, que é marca Dal Ponte, fabricado pela Dresch também. Então, hoje tem dois times em quadra, nenhum com a marca Dresch, mas os dois fabricados por ela.

A_Luzerna_Falas LDE Com qual frequência é preciso investir em maquinário? Tecnologia em tecidos também?

A_Luzerna_Falas DD A cada semestre chega alguma coisa. Maquinário de costura, a gente tem tentado trocar as máquinas antigas, que vão dando problemas, por máquinas novas. Com certeza, tecnologia de tecidos diferentes, usando impressoras digitais que fazem qualquer tipo de impressão com 100% de qualidade.

A máquina é digital, ela imprime uma folha com uma estampa em cima e vai para uma outra máquina que estampa em sublimação na camiseta branca. Hoje, os concorrentes da região não têm esse tipo de tecnologia, é mais artesanal. Enquanto temos uma impressora digital, que imprime uma folha para depois imprimir na camisa, a outra trabalha com tinta, o mesmo processo de serigrafia, só que serigrafam em cima de uma folha gigante e depois passa para uma camisa. Com esse processo, muitas vezes quando passa para a camisa, a cor mudou, ou mistura as cores e fica borrado, e com a impressora digital não é assim.

A_Luzerna_Falas LDE Qual o tipo de tecido que vocês dispõem? Vejo que tem Dry-Fit e tantas outras. Aquele tecido utilizado pela Nike, que dizem ser feito de material reciclado, é algo exclusivo ou qualquer um pode ter?

A_Luzerna_Falas DD O nome do nosso tecido é Dry-Sport, praticamente o mesmo que o Dry-Fit, o que muda é o fornecedor, dependendo dele o nome muda. Esse Dry-Sport é um tecido que transpira muito bem, absorve o suor e a camisa fica leve, pega um dia de chuva e não fica pesada, colada, seca rápido, também tem fácil lavagem.

Sobre o reciclado, essa tecnologia existe, mas nós não chegamos lá ainda. É possível, sim, ter esse material, mas a gente nunca pesquisou sobre ele, já pensou e tudo mais, só que um clube amador quer preço do produto, então não adianta investir em coisa cara e que não vai ter retorno.

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A_Luzerna_Falas LDE Qual a contribuição da Dresch na proximidade com o mundo esportivo?

A_Luzerna_Falas DD Acredito que a gente agregou na qualidade, o que para os times de futebol contribuiu pela aproximação do fardamento profissional, muitas vezes até melhor que o de um profissional que usa uma marca maior.

A_Luzerna_Falas LDE Para finalizar, como é moda hoje as empresas quererem se diferenciar com propostas ecológicas, vocês têm alguma?

A_Luzerna_Falas DD No produto a gente não tem, mas uma coisa muito bacana é o seguinte: como trabalhamos com confecção, sobra muito retalho de tecido e doamos para algumas instituições da cidade, que fazem bonecos de pano, tapetes, e revendem para sustentar as ONGs. Por enquanto, essa é a única parte ecológica que a gente faz.

por Ricardo S.
ImagensDivulgação
Publicado em 27.06.2012

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