Portas abertas para as produções alternativas

22-07-2015c

“(…) Assegurar ao cidadão o pleno exercício do direito de acesso e uso do livro (…)”. É o que propõe a Lei Nº 10.753, ou a Lei do Livro, no seu artigo 1º, parágrafo I, que institui a Política Nacional do Livro, assinada em 30 de outubro de 2003. Contudo, a realidade do país é a de que poucos leem, já que a média anual é de 1,8 livros por pessoa!

Publicar um livro no Brasil por muito tempo não foi fácil. Para o consumidor, o preço dos livros, proporcionalmente ao salário mínimo, sempre foi assombroso. Para quem produz, a grande questão é se dará ou não lucro significativo, e ainda, a divisão do mesmo entre editor e autor. Mas, antes de tudo, o conhecido dilema de ser necessário o interesse de alguma editora pela obra.

Fora dessa corrente, as ditas editoras independentes surgiram como alternativa para as dificuldades mercadológicas. As propostas são várias: produzir livros baratos, dar espaço para publicação de temas menos comerciais, ou mesmo oportunidade para quem não encontra espaço nas grandes editoras. Em algumas, mediante um orçamento – em que se considera tiragem, número de páginas, tipo de papel, entre outras coisas -, praticamente qualquer um pode publicar.

A Oikos é um exemplo de editora que atinge o público que tem dificuldades para ter sua obra publicada. “Várias pessoas nos pediam apoio logístico e legal na publicação de suas obras, de forma independente, especialmente na revisão, editoração e registro”, diz Erny Mügge, falando da criação da Oikos. Sobre o mercado, Mügge afirma que é difícil autores novos ganharem espaço nas grandes editoras, pois elas precisam vender bem para ter retorno, e os autores desconhecidos vendem pouco, ainda mais se não for feito um amplo trabalho de divulgação, o que custa caro.

A editora se responsabiliza pela diagramação, revisão ortográfica, arte-finalização, fornecimento de ISBN, ficha catalográfica e impressão. Depois de pronto, as informações do livro publicado vão para um catálogo virtual disponível em seu site, funcionando como forma de divulgação. O autor, numa das características do formato editorial independente, quase sempre fica com os direitos autorais das obras e aparece como peça responsável pela distribuição e comercialização das mesmas. “Um dos maiores desafios hoje está na distribuição de livros. Ela representa praticamente 50% dos custos. Isso faz com que o preço final de um livro fique efetivamente caro para o consumidor”, conta Mügge.

Outra editora que ajuda os pequenos escritores é a AGEI, Associação Gaúcha de Escritores Independentes. A AGEI funciona também como elo entre esses escritores e o mundo literário e fornece o apoio técnico que eles precisam para publicar um trabalho. Fundada em maio de 2001, reúne autores sem vínculos com grandes editoras, seja por opção ou mesmo pela dificuldade em ter seus trabalhos aceitos pelas mesmas.

Segundo o seu atual presidente, Vilson Quadros, a entidade não busca o lucro, mas precisa de subsídios para se manter atuando. “A maior parte do lucro que temos é durante a Feira do Livro de Porto Alegre, já que poucos associados pagam mensalidade”, revela Quadros. A banca na Feira do Livro foi conquistada com muita luta, e foi cedida pela Secretaria de Cultura de Porto Alegre, quase um ano após a fundação da AGEI. Hoje, a associação conta com a participação de cerca de 200 escritores, proporciona sessões de autógrafos e dá todo o apoio necessário.

Vilson diz ainda que a divulgação das obras é muito importante, “Têm escritores que acham que com o livro finalizado não precisa se fazer mais nada, mas não é assim que funciona. Quando fiz meu primeiro livro consegui vender 2 mil exemplares, e o trabalho de divulgação foi árduo”, ressalta. A AGEI ajuda ainda na divulgação de títulos na mídia, sejam eles publicados pela associação ou de outra forma independente.

Numa mesma banca, mas na Feira do Livro de São Leopoldo, Aderbal Braz representava, no Rio Grande do Sul, a Editora Expressão Popular. Pensada desde 1999 e ligada aos movimentos sociais, a Expressão chegou ao mercado não com o intuito exclusivo do lucro, mas determinada a catalisar o hábito da leitura entre os brasileiros. E essa prática não é ilusória, pois comparado com a média, o valor dos títulos são bem acessíveis: oscilam entre 3 e 22 reais. E a qualidade que não deixa a desejar a qualquer outra editora.

Palavra que não falta para este “milagre” no circuito editorial é a militância, imprescindível para tal barateamento dos exemplares. Braz grifa que é gratificante trabalhar com a editora: “A aceitação por parte do público leitor, que está engajado na ideia de que todos possam ter acesso à leitura, é surpreendente”. No ramo dos livros há 30 anos, lida há sete com direcionamento político, a partir da representação da revista Caros Amigos e do Jornal Brasil de Fato no Estado. “A diferença é muito grande. Estou fazendo um trabalho de divulgação de um ano para cá, pegando os autores, dando cartões, com isso as pessoas vão lá buscar o livro. Esse tipo de leitura não se encontra facilmente em livraria”.

O trabalho em células espalhadas pelo País é satisfatório e reafirma o voluntarismo, não apenas para baratear o produto final. Braz percorreu a capital e o interior gaúcho com João Pedro Stédile, que organiza uma série da Expressão: “Fizemos uma divulgação no lançamento do livro ‘A Questão Agrária’, que na época tinha até o número 3. Hoje está no 5º volume. É bom, e mesmo aqueles que não têm conhecimento chegam até a gente. Entre nós é uma família, dos movimentos sociais como a Via Campesina, o MTA e outros sociais do MST”.

Apesar das dificuldades na publicação, algumas coisas já foram feitas para impulsionar o mercado editorial. A Lei do Livro, medida tomada em 2004, visa à extinção da cobrança do PIS/Pasep e Confins na produção e comercialização de livros por editoras, distribuidoras e livrarias. Já a Lei Rouanet, de 1991, abate até 4% do imposto de renda para patrocínios culturais. Além disso, divulgações pontuais em feiras e sites dão a interatividade necessária para entender a realidade das editoras independentes.

por Ricardo S. + Ana Paula S. + Larissa O.
Imagem: Reprodução/www
(Publicado originalmente em 2008)

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