Ação, Reflexão e Transformação

Fabiana Moraes sobre regulação da mídia: “Não tem como deixar essa discussão pra outro governo”

A jornalista, colunista do The Intercept e escritora também fala do seu novo livro, “A pauta é uma arma de combate”

por Helena Dias

O papel do jornalismo na defesa da democracia foi um dos principais debates durante as Eleições 2022. Enquanto mais uma onda de desinformação tomava corpo por meio da disseminação de notícias falsas, a imprensa era desafiada a criar novas relações de credibilidade com a sociedade.

Foi em meio a este contexto que a jornalista, professora e pesquisadora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Fabiana Moraes, lançou seu novo livro A pauta é uma arma de combate, que aprofunda o que a autora conceitua como “jornalismo de subjetividade”, que aborda as questões relacionadas ao posicionamento e sensibilidade.

Fabiana é professora do curso de Comunicação Social da UFPE e pesquisadora, autora dos livros Os Sertões (2010), Nabuco em pretos e brancos (2012), No país do racismo institucional (2013), O nascimento de Joyce (2015) e Jomard Muniz de Britto: professor em transe (2017). O Brasil de Fato Pernambuco conversou com ela sobre a importância do jornalismo para o momento histórico que o Brasil está vivendo. Assista:

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Brasil de Fato: Começando a conversa pelo seu novo livro, o que seria uma pauta arma de combate no contexto em que vivemos de defesa da democracia no Brasil?

Fabiana Moraes: Essa ideia da pauta como arma é pensando que a pauta do jornalismo ela não é apenas um roteiro de como fazer a matéria quando a gente vai para a rua ou vai fazer uma reportagem. A pauta é um lugar de ação e de reflexão, entendendo que ela no jornalismo é também o lugar no qual podemos realizar ações justamente que podem contribuir com a melhoria da democracia no Brasil.

Por exemplo, quando eu for realizar uma pauta, eu também posso realizar ali uma forma de viabilização muito mais integral e íntegra de pessoas e grupos, de temas que a gente geralmente vê na imprensa. Eu posso não repetir as violências e estereótipos que a gente já viu. Então eu entendo a pauta como uma arma de combate nesse sentido de uma ferramenta de ação, reflexão e transformação.

BdF: No seu livro “O Nascimento de Joyce”, publicado em 2011, você já trazia o conceito de “jornalismo de subjetividade” e agora você aprofunda. O que seria esse jornalismo?

FM: De fato eu falei a respeito desse contexto em “O Nascimento de Joyce” em 2015 e de lá para cá eu tive contato com uma série de outras literaturas, conversas, apresentações de artigos, debates com outros colegas que são sempre tão importantes. É justamente quando eu me deparo com uma perspectiva de objetividade no feminismo e que está relacionada à colonialidade no jornalismo, o jornalismo como sendo esse lugar de forte apelo colonial como a nossa sociedade no Brasil como um todo, é quando eu vou percebendo que tem elementos com os quais eu posso qualificar melhor a questão do debate sobre subjetividade.

Nesse livro (A pauta é uma arma de combate) eu percebo que tem cinco temas que fazem parte do que eu chamo de jornalismo de subjetividade: reflexividade contínua sobre ensino e prática; crítica aos valores notícia; capacidade criativa e criadora; a dimensão ativista ou posicionada e sensibilidade hacker; e a interseccionalidade. Isso eu vou debater bastante no segundo capítulo do livro cujo o título é “Tirando a subjetividade do armário”.

BdF: Fala-se em reconstrução do Brasil após a decisão das Eleições 2022 e a regulamentação da mídia assim como o fortalecimento de uma comunicação pública são pautas importantes para essa agenda. Quais são os primeiros passos que devem ser dados nesse sentido a partir de 2023?

FM: A gente tem uma discussão já antiga e que me parece que ali no final do governo Lula fica meio engatilhada e depois fica na gaveta, que é a questão da regulamentação midiática que é um tema que está sempre aparecendo. Então, quando você entra nessas questões, não tem mais como deixar essa discussão para um outro governo. Eu acho que o próprio Lula, o próprio PT e a própria Dilma sofreram bastante com essa falta de regulamentação.

Obviamente que a gente sabe que é uma discussão enorme, todas as vezes que se fala em regulamentação a imprensa de referência, essas grandes famílias, começam a falar de censura. Não é de censura que a gente está falando, a gente está falando sobre democracia.

BdF: Falando sobre o Nordeste, qual o papel atual do jornalismo na construção de uma região menos estereotipada e no combate à xenofobia?

FM: Eu acho que é uma questão pra se pensar no e para o Nordeste, mas eu acho que é um movimento que precisa ser feito por outras regiões e principalmente pelas regiões que concentram a maior parte da riqueza brasileira. Ou seja, que concentram a desigualdade brasileira em contraste com o Nordeste e o Norte. Eu acho que o que a gente viu nos últimos anos tem muito a ver com essa xenofobia e nos ensina muito sobre o que não deve ser repetido.

Eu me lembro muito bem que no fim do primeiro turno das Eleições 2022 o UOL, a CNN e outros veículos deram uma matéria explicando que as regiões nas quais Lula teve maior votação são campeãs de analfabetismo e isso é de uma imensa xenofobia e classismo. Depois elas fazem uma matéria para fazer uma crítica a Bolsonaro porque ele estava sendo xenófobo, mas ele estava usando as informações que esses veículos publicaram. E é muito interessante que esses veículos não publicam a relação da concentração de células nazistas com alguns outros votos. Ou seja, o que chama atenção deles é o analfabetismo. E aí eu pergunto: Seja nordestino, seja do Sudeste ou Centro-Oeste, existem pessoas analfabetas em todo país. O voto analfabeto é um voto menor?

{ Brasil de Fato Pernambuco }

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