Não permitem conciliação.


| Reprodução/www |

Crise no jornalismo burguês é logro da luta palestina

por Enrico di Gregorio e Ângelo de Carvalho

Na semana passada, oito jornalistas do monopólio de imprensa britânico British Broadcasting Corporation, a BBC, enviaram uma carta de 2,3 mil palavras ao Al Jazeera na qual denunciavam a cobertura de sua própria emissora acerca da guerra de agressão sionista contra a Palestina. Segundo o documento, a cobertura pró-Israel da BBC contava com a valorização maior da vida dos israelenses e omissão de importantes fatos históricos e atuais. Essa é só uma das várias pontas da atual crise que abala o jornalismo imperialista desde as redações dos monopólios de imprensa de todo o mundo.

Na segunda semana de outubro (e segunda semana da guerra), a BBC já havia tirado seis jornalistas do Oriente Médio do ar por conta de postagens pró-Palestina em suas redes sociais. No mesmo período, o jornalista veterano Bassem Bounneni, correspondente do Norte da África para a mesma emissora, anunciou sua demissão. As jornalistas tunisianas Achouad Hannachi e Amani Oueslati, da emissora francesa Canal+ também se demitiram. Nas terras ianques, a revista New York Times Magazine foi abalada com a carta de demissão da escritora, poetisa, vencedora do Prêmio Pulitzer e agora ex-editora da revista, Anne Boyer. As jornalistas Jazmine Hughes e Jamie Lauren Keiles, da mesma revista, também se demitiram e se juntaram à organização “Escritores Contra a Guerra em Gaza”, fundada em moldes similares à organização criada em 1965 “Escritores Americanos Contra a Guerra do Vietnã”.

Esses são somente alguns dos jornalistas que apresentaram demissões ou foram demitidos de grandes monopólios de imprensa por discordarem da linha editorial e cobertura dos veículos em que trabalhavam acerca dos atuais acontecimentos no Oriente Médio.

Declarações

Nas cartas e pronunciamentos, não faltou rechaço profundo à cobertura feita pelos jornais monopolistas e um profundo apoio à causa Palestina.

“Desde o dia 7 de outubro, minha colega (de trabalho) e amiga tunisiana, Amani Oueslati e eu decidimos nos demitir do Canal+. Nós não pisamos mais lá desde então! Nosso profissionalismo, nossa criação e nosso inabalável apoio à causa palestina não permitem conciliação! #FreePalestine”, disse a ex-jornalista do Canal+, Achouad Hannachi, no facebook.

“A BBC não conseguiu contar esta história com precisão – por omissão e falta de uma posição crítica com as reivindicações de Israel – e, portanto, não conseguiu ajudar o público a envolver-se e a compreender os abusos dos direitos humanos que se desenrolam em Gaza. (…) Milhares de palestinos foram mortos desde 7 de outubro. Quando será que o número será suficientemente elevado para que a nossa posição editorial mude?”, questionaram os oito jornalistas da BBC.

“Você já pensou no que isso poderia custar? Pensei na humilhação se simplesmente nos submetermos docilmente, nos esforçarmos e rastejarmos”, postou Bounneni em sua rede social X (a frase é a citação de um filme da década de 1960), momentos após anunciar sua demissão conforme “exigiu” sua “consciência profissional”.

Já na carta de Anne Boyer, a escritora denunciou a guerra promovida pelo “Estado israelense com apoio do Estados Unidos contra o povo de Gaza” e as “décadas de ocupação, deslocação forçada, privação, vigilância, cerco, prisão e tortura” sofridas pelo povo palestino. “Não posso escrever sobre poesia no tom ‘razoável’ daqueles que pretendem nos acostumar a esse sofrimento irracional. Chega de eufemismos macabros. Chega de paisagens infernais higienizadas verbalmente. Chega de mentiras belicistas. Se esta demissão deixa nas notícias um buraco do tamanho da poesia, então essa é a verdadeira forma do presente”, concluiu a ex-editora.

O papel dos palestinos

É evidente que a Resistência Nacional Palestina e as massas populares de todo o mundo têm papel central nesse importante fenômeno em desenvolvimento.

Os patriotas palestinos, ao travarem sua guerra justa com elevado manejo político, com elevação a todo momento das causas e objetivos de libertação nacional por trás das operações, sem violarem os direitos básicos dos prisioneiros de guerra e com respostas sólidas às mentiras do Estado de Israel, dificultam ao máximo a cobertura pró-sionista dos monopólios de imprensa.

Na retaguarda, as massas populares, ao elevarem a solidariedade ao povo palestino, impuseram duríssima vigilância e denúncia contra as tentativas de Israel e seus porta-vozes nos meios de comunicação monopolistas de demonizarem, criminalizarem e descredibilizarem o povo palestino e sua luta. Podemos lembrar do dia 14 de outubro, em que a sede central da BBC, no Reino Unido, foi alvejada com tinta vermelha por um grupo pró-Palestina. O conluio sionista dos monopólios de imprensa perdeu nas mentiras sobre o “assassinato ensandecido” de israelenses (hoje, se sabe que muitos dos mortos na rave e nos kibutz o foram pelas próprias munições sionistas lançadas desde os helicópteros ianques Apaches), na “decapitação de bebês” (até hoje sem provas críveis e também desmentidas, inclusive por jornais israelenses) e nos “maus tratos” aos prisioneiros de guerra, malchamados de “reféns” (comprovadamente falsos, segundo filmagens disponibilizadas pelo Hamas e depoimentos dos próprios prisioneiros, como a ex-detida Yocheved Lifshitz).

Desesperado, o Estado sionista, derrotado militarmente e politicamente, golpeia para todos os lados, às vistas de todos, com o massacre desenfreado e sucessivos crimes de guerra contra o povo palestino. Foi assim, por exemplo, nos bombardeios de fósforo branco contra Gaza e Sul do Líbano, na destruição do Hospital de Al-Ahli, na invasão do Complexo Médico de Al-Shifa e, claro, em todo o genocídio que já vitimou mais de 14 mil palestinos, dentre eles 7 mil crianças.

Redações abaladas

É claro que as redações não passariam inabaladas por um dos maiores acontecimentos de nosso século até o momento. Dado o posto de destaque que a imprensa ocupa na sociedade, era de se esperar que os porta-vozes das classes dominantes aprofundassem a guerra da informação para proteger o velho sistema de dominação.

Esse fenômeno não é de hoje, e os meios intelectuais o comprovam (por mais que possam, por vezes, errar nas conclusões) com o aumento dos estudos desde os anos 2000 sobre a “crise do jornalismo” atrelada à “queda da qualidade”.

Não é somente perda da qualidade, ou mesmo expressão da “disputa de narrativas”, termo politicamente vazio usado para substituir outros melhores, como “verdade” ou “posição de classe”: o que está a olhos vistos é a decadência, em todas as frentes, da velha sociedade e seus guardiões frente à crise geral do imperialismo, ao aumento da rebelião dos povos em todo mundo, seja esta espontânea, seja organizada, ou até mesmo armada, e às derrotas políticas e militares por parte dos imperialistas e reacionários.

Claro, essa ofensiva reacionária nos meios de comunicação não ocorreria sem mover o seu oposto. Bounenni, Boyer e Hachanni o provam. Outros jornalistas progressistas e democratas ainda se manifestarão. Os comprometidos com a verdade e com as massas populares ainda operam com tranquilidade. Ao fim, a crise e a derrocada do jornalismo burguês e reacionário serão acompanhadas, inevitavelmente, do fortalecimento e do crescimento do jornalismo popular e democrático. Aguardemos.

{ A Nova Democracia }

░░░░░░░░░░░░

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.