A próxima redenção

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Maus exemplos, necessárias constatações…

O texto foi recebido através do ‘Direto da Redação’. (Ricardo S.)

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As metáforas do futebol

por Rodolpho Motta Lima

Não sei – e talvez nem interesse saber – quem está certo ou errado nessa questão que envolveu o jogador Ronaldinho “Gaúcho” e o Flamengo. O que sei é que o episódio é emblemático, eu diria metafórico, como, aliás, se prestam a ser quase todas as ocorrências no âmbito do futebol, não por acaso uma marca nacional.

O assunto envolve a fácil mitificação de ídolos, cuja perpetuação, às vezes contrariando a realidade, é promovida por interesses de todo gênero. Tais interesses passam pelo “marketing” destinado a fazer a cabeça do cidadão (visto muito mais como um consumidor francamente manipulável), trafegam pela necessidade de fatos espetaculares a serem explorados à exaustão pela voracidade da mídia e, no caso do futebol, enveredam pelo aproveitamento político que os cartolas de sempre extraem da paixão dos torcedores e terminam pela velha estratégia ideológica de amortecer consciências e revoltas com processos de alienação. Em uma das incontáveis paródias da “Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias, alguém cunhou os versos: “Minha terra tem Palmeiras, Corinthians, Santos e Vasco”… Bem no espírito lúdico-irônico que as paródias encerram, é fácil entender a crítica: somos mesmo, no duro no duro, o país do futebol… E muitos dos vícios do futebol são os nossos vícios…

Não estão muito longe os poucos meses em que a diretoria do Flamengo promoveu um espetacular “oba oba” – repercutido e ampliado pela  mídia – que apresentava o jogador à massa rubro-negra como um verdadeiro Messias das quatro linhas, capaz de conduzir o clube a todas as conquistas, a todos os sucessos, uma fonte permanente de alegrias. Um produto mágico, amparado em um ambicioso projeto mercadológico (que naufragou, aliás, no meio do percurso).

Como se não se vivesse em um mundo globalizado – em que a grande aldeia global é visualizável por todos os ângulos -, contratou-se a peso de ouro um jogador em marcante declínio na Europa, acreditando que, no Brasil, seria o melhor de todos, ainda que com uma só das pernas… E quem o contratou? O maior dos clubes de massa desse país, paradoxalmente cheio de dívidas, dirigido por alguém com notória atividade política e que talvez tenha enxergado (?) no episódio, além de tudo, uma oportunidade promocional…

A partir daí, o que se viu foi uma sucessão de fatos que foram construindo insidiosamente uma crônica da irresponsabilidade anunciada. De um lado, um clube que busca um atleta que já fora o melhor do mundo, com um contrato que envolveu uma fábula de dinheiro que não se justificaria, em um país como o nosso, nem nos tempos áureos do jogador como fenômeno esportivo planetário. Contrato que, aliás, segundo o jogador, acabou não sendo honrado, com atrasos e ausência de pagamentos devidos. Por outro lado, um astro que, aparentemente, abriu mão de dar continuidade à sua história de glórias no campo futebolístico, nem sempre tendo comportamento compatível com o que se espera de um atleta, preferindo outros doces prazeres da vida, o que, é claro, seria uma opção perfeitamente válida se ele estivesse jogando o futebol esperado…

O atleta rompeu seu contrato com o clube, alegando as dívidas salariais que o Flamengo acabou deixando que se acumulassem. Uma atitude indiscutível, do ponto de vista trabalhista. Mas o clube, agora, ameaça acioná-lo por diversas atitudes contrárias ao decoro profissional que Ronaldinho teria assumido no decurso do contrato e que, segundo o clube, são todas comprováveis. Dá para dizer que existe alguém correto nessa história? Volto à teoria da metáfora: o episódio exemplifica toda a ambiência negativa que preside muitas das relações profissionais, políticas, e até pessoais no cotidiano brasileiro. Defeitos e problemas são escondidos, escamoteados, até desmentidos… enquanto convém a ambas as partes. Esgotada a conveniência, segue-se a demonização recíproca dos envolvidos. Basta ver a forma como os advogados de ambos os lados se dirigem, agora, à parte contrária. Há, no ar, a ameaça de uma batalha judicial com armas em que a ética deve sair  perdendo de goleada para a baixaria.

Fiel à minha afirmação primeira, não consigo achar um mocinho nessa história de vilões. Só acho que tudo isso tem a ver com outras situações que vivemos hoje no país, extremamente carente de “mocinhos”, mas repleto de celebridades ora santificadas ora satanizadas, ao sabor das circunstâncias…

Mas, como nem tudo está perdido, sempre há a possibilidade da redenção. É com ela, por exemplo, que, nesse caso Ronaldinho, acena o Presidente do Atlético Mineiro, ao contratar o jogador, em um processo tão meteórico quanto discutível. O atleta e o novo clube falam em esquecer o passado e construir um futuro promissor, no melhor dos mundos… Será? Mas o Flamengo não fica atrás, não entrega os pontos. Afinal, tudo indica que vem aí o Adriano…

Publicado em 18.06.2012

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