(…) Well, show me the way
To the next whiskey bar
Oh, don’t ask why
Oh, don’t ask why (…)
[ ‘Alabama Song’, The Doors ]
Éramos cinco, quase nome de livro, hein? Um pequeno grupo que a pouco fora formado, coisa de encontro na estação… Três mais dois, cinco, talvez uma ameaça ao segurança do Pepsi On Stage, em Porto Alegre (RS), que perdeu de ouvir o trecho acima quando moleque e não quis dar informação:
– Boa noite, com licença, poderia me mostrar o caminho? – para poupar de escrever ao leitor que era necessário saber o acesso à casa.
Pela resposta do mancebo, tentava encontrar nele uma embriaguez, junto da sensação de imaginar ter dito alguma ofensa. Ou que o Português era um dialeto incompreensível para o nível do guardião, traduzido no dicionário mental em rápidos segundos: má-vontade, finesse local e melhor não continuar. A inflada nas narinas do The Bodyguard não lá um bom cartão de visitas, se repetisse a dúvida provavelmente seria um homem não morto, mas hematoma é foda. No show dos ‘Riders on the Storm’, metade do time do The Doors, a porta do whiskey bar do Alabama porto-alegrense até estava aberta, porém não muito lubrificada. Saloon que é saloon…
(…) Your life’s complete
Follow me down
Can’t you see me growing, get your guns
The time has come (…)
[ ‘Tell All The People’, Robby Krieger ]
O papo do Robby Krieger, em ‘Tell All The People’, não agradou nem ao Morrison, na época do ‘The Soft Parade’, de 1969. Segundo as lendas roqueiras, cada um assinou as respectivas composições, sem atribuir à banda, fruto da objeção do Jim a cantar o trecho quase repetido em 2008, haja vista a recepção à la ‘Os Imperdoáveis’. Desarmado e sem porquê para perigoso, à tangente, como o Rei Lagarto que não quis cantá-la.
Os 30 segundos de ‘Desejo de Matar’ foram suficientes para o trio seguir para um lado e a dupla para outro. Não teria a chance de ver “Os Doors do Século XXI”.
(…) Made the scene from week to week
Day to day, hour to hour
The gate is straight
Deep and wide
Break on through to the other side (…)
[ ‘Break on Through’, The Doors ]
O que interessava, ver e ouvir o que discos e mil imagens trouxeram de expectativas ao longo do tempo, quando o espetáculo é de grandes como os Doors/Riders on the Storm, verbetes no dicionário do Rock. Sem preocupação de separá-las, apesar dos desfalques do time, prontamente substituídos num jogo que poderia ter terminado, contudo continua. E esse é o lance, o que fez esperar e talvez ser um dos últimos – pela agenda da tour – a citar a passagem do quinteto pelo Brasil, vem à memória em ‘Ainda Muito Loucos’ (Still Crazy), filme interessante e que consagra uma banda que não existiu, a ‘Strange Fruit’, vale a curiosidade em torno dela. Bandas que voltam… ‘Mercenários’ como os Pistols? Metade do escrete como o Led Zeppelin? Perda de tempo, ruim é a volta dos que não foram, grupos que pegaram carona nestes ventos filmados e antecipados na Inglaterra, final da década de 90 para cá. Na era glacial neoliberal, ou se preferir, década 2000, saem os covers, entram as reuniões! Dito e feito, só que ninguém contava – mas era óbvio – com o retorno – olhe a volta dos que não foram aí! – dos covers a ocupar a lista de atrações das casas de shows. No máximo, trabalhos para ‘reunir o pessoal’ de duas ou três bandas da hora e fazem um som conceitual…
(…) Riders on the storm,
into this house we’re born,
into this world we’re thrown
like a dog without a bone,
an actor out alone (…)
[ ‘Riders on the Storm’, The Doors ]
Com as trombetas de Carmina Burana para anunciar a cavalaria, não tem pra ninguém a ‘parceria’ dos californianos com Carl Orff, o autor. Aliás, difícil não lembrar do Jim Morrison durante a execução desta música. Ou da estátua cara de pau (de mármore, talvez), num cemitério de Paris, que fecha filmes como ‘The Doors’, de Oliver Stone, ou ‘The Doors – Live in Europe 1968’ e a única tour do então quarteto pela Europa.
Ty Dennis (bateria), Phil Chen (baixo e camisa à la Grêmio) e Brett Scallions (vocal) se juntaram a Ray Manzarek (teclados, vocais e doses de cachaça) e Robby Krieger (guitarrista), eles mesmos. Sai “O Fortuna” de Carmina Burana e chega “Love Me Two Times”, às 22 horas, pontualidade para dois jovens senhores. Talvez cinco mil pessoas assistiram à avalancha de êxitos. Os detalhes, que tanto importavam num outro canto “Rock” da cidade, tipo “se é hype ou não é” (blergh!), ao lado do Aeroporto Salgado Filho o céu era de brigadeiro, uma amostra de parte da mística dos Doors. Profissional na batera, baixista oriental que já tocou com Ray Charles, Peter Frampton, Chuck Berry, para citar alguns… Não seria o vocalista, por não ser o Jim, que pagaria a conta; a sua antiga banda, “Fuel”, apesar de parecida com mais umas 7 ou 8 do final dos anos 90 e início desta, efetivou Scallions como cavaleiro da tempestade. Existem também uns vídeos que circulam na www nos quais ele canta ao lado de Duff McKagan e Slash, do Guns ‘N Roses; mais para front man que an american prayer.
(…) So when the music’s over
When the music’s over, yeah
When the music’s over
Turn out the lights (…)
[ trecho de ‘When The Music’s Over’, The Doors ]
Então a música teria que terminar, a tempestade iria dar lugar ao Sol, esperado a partir de quando um saudoso amigo, num whiskey bar do interior do Brasil, recinto de tacos de sinuca e testosterona, onde progesterona dificilmente entrava sequer para comprar caixa de palitos de fósforos que acabou perto do almoço… Saíra de lá com o “kit The Doors” semicompleto, quarteto no Hollywood Bowl, discos, VHS, Letras Traduzidas, toda a preparação involuntária – há 17, 18 anos antes – para o 12.04.2008. Após passarem sambinhas encachaçados, maracas xamânicas e covers como ‘Gloria’, do ‘Them’ de Van Morrison, ou a decantada ‘Alabama Song (Whiskey Bar)’, sempre junta de ‘Back Door Man’, as duas do primeiro álbum, de 1967. Sol e fogo acendidos, da épica ‘Waiting For The Sun’ no meio e ‘Light My Fire’, desconstruída na saideira, as portas abriram o déjà vu de primeira viagem. Sem acompanhar a ‘Spanish Caravan’, por favor!
por Ricardo S.
Imagens/Show: Michael Paz Frantzeski
Imagem/Jim Morrison: Reprodução/www
(Publicado originalmente em 2008)