Tamborete neles!

14-06-2016e

Valendo-me da essência do sítio, por que não ceder espaço também aos selos independentes? Esse questionamento veio à mente dias atrás, quando imaginei o quanto seria útil para mim, para os selos, e óbvio, para os leitores, enfim, conhecermos um pouco mais sobre esses ‘mecenas’ que catapultam, de uma forma ou de outra, o talento daqueles grupos de quem sempre gostamos de escrever, ouvir ou mesmo abominar.

Diversas vezes postos à escanteio e relegados à relativa obscuridade, em função do solo matador, do vocalista podrão ou da melodia inesquecível, nada tão natural quanto apresentá-los ao público consumidor ou àquele grupo ainda sem chances de lançar o seu trabalho. É bem (mal) verdade que existem selos independentes com alma de grandes gravadoras, mas aí é outro departamento e aqui nesse espaço, não os caberia. Decerto, a trajetória será o atestado de qualidade que os garantirá nas nossas próximas linhas e noutras oportunidades. Serviços prestados ao circuito alternativo será a tônica!

E assim, o chamado pela ‘Tamborete Entertainment’, hoje capitaneada somente pelo Leonardo Panço – também guitarrista da banda Jason -, para que os seus passos, quem sabe, sejam inspirações a futuros, novos e antigos selos, nos erros (evitáveis) e acertos (no mínimo, copiáveis!).

Segue um bate-papo com ele, onde história e boas novas referentes à Tamborete estão em evidência. Enfim, o outro lado do disco!

> > >

A_Luzerna_Falas Ricardo Santos Em qual dimensão estava o circuito independente à época da criação do selo Tamborete?

A_Luzerna_Falas Leonardo Panço No começo a ideia era minha e do Rafael Ramos. Na real, eu ia lançar o Ragnarok pela Panço Records e ele o Sex Noise pela Azeitona Music. Daí nos juntamos pra lançar os dois e chamamos a junção de Tamborete Entertainment.

Chamamos 3 amigos para ajudar e podermos ter várias funções divididas, mas não rolou. Ficamos só nos dois mesmo. Isso foi no final de 96, começo de 97. Eu trabalhava na EMI, onde o pai do Rafael era o vice-presidente; ele já tinha a vivência de ter nascido no lance, de ter hospedado Zizi Possi, essas coisas. E aí fomos, lançando o que surgia e o que gostávamos. O “Entertainment” era porque eu queria abrir a possibilidade de lançar outras coisas. Ainda quero e esse ano irei lançar um livro meu; já tenho um segundo pronto e também vou lançar, mas não creio que esse ano.

Era pra isso que queríamos uma gravadora: pra lançar quem não tinha espaço porque fazia o que gostava, pra lançar o que a gente quisesse, sem mais nem menos. A época era diferente do que é agora. Parece pouco tempo, mas as coisas vêm mudando mesmo. Agora temos mais festivais, mais estrutura com a internet, mais sites pra divulgar os trabalhos. Acho que ainda tem que mudar muito e muito. Não tem rádio, quase não tem programa de tv, as rádios comunitárias têm pouco alcance, pouco espaço. A internet é um espaço mágico, livre, a verdadeira anarquia da auto-gestão. Mas e quem não tem nem luz, como vai ter computador, pra hospedar mp3 e as pessoas baixarem? Ainda me parece um pouco complexo, porque tem essa onda de ter que pagar por download feito. Depois que o mp3.com fechou, ainda não colocamos nossas músicas em outros sites. Quem quiser fazer isso, sinta-se à vontade.

A_Luzerna_Falas RS Você agora está conduzindo ‘sozinho’ as atividades da gravadora?

A_Luzerna_Falas LP Lá pelo 14º cd, mais ou menos, o Rafael resolveu sair pra se dedicar à gravadora dele com os pais, chamada Deckdisc e que é hoje a maior independente do Brasil, de repente até da América Latina, sei lá. Eles já lançaram muitas coisas, como Ira!, Ultraje, Pitty, Marcelinho da Lua, agora o Dead Fish, várias coisas.

E aí eu segui em frente. Lancei 24 CDs até agora. Na verdade tem quase dois anos que eu resolvi não lançar nada para arrumar a casa. Não tinha mais onde colocar CDs, as bandas estavam quase todas paradas, não tinha site, não tinha várias coisas. Esse ano volta a lançar.

A_Luzerna_Falas RS Por haver sido um dos pioneiros, como você observa o boom de selos independentes aqui no Brasil? Pelo fato de no final das contas existir o fator econômico, há brodagem entre eles ou “salve-se quem puder”, cada um defendendo o seu?

A_Luzerna_Falas LP É sempre bom que tenha vários selos lançando discos. Não tem como lançar tudo que está por aí. No final das contas só vai ficar por mais tempo quem gostar muito do que faz e conseguir ter alguma estrutura. No geral, a maior parte se ajuda distribuindo material do outro.

A_Luzerna_Falas RS E a nova lei sobre direito autoral, veio para contribuir positivamente com o circuito alternativo?

A_Luzerna_Falas LP A princípio não vejo mudando nada. Serve para ajudar quem vende bastante. Quem faz mil cópias do próprio bolso não tá interessado em o CD ser numerado ou não. Não muda nada. Eles dizem que as músicas vão ter em algum momento um registro digital para poder saber onde foi que ela tocou no país inteiro… Isso pode ajudar o artista a não ser enrolado na hora de receber. Isso sim será útil!

A_Luzerna_Falas RS O que pesa na contratação de novas bandas, ou mesmo em relação à permanência no selo? Pode-se dizer que a Tamborete, com site e discos novos, está dando um gás na sua produção musical e abrindo possibilidades para lançamentos mais frequentes?

A_Luzerna_Falas LP Tem várias questões. A banda tem que ser boa, ou até ser ruim, mas eu gostar. É essencial que tenha a gravação pronta também.

Nos últimos tempos ficou mais difícil conseguir bancar o estúdio para a gravação. É vital que seja um grupo ativo, tocando sempre. Já fiz algumas escolhas erradas por conta desse quesito, bandas que pararam de tocar logo após o CD ser lançado. Foram discos que não deram tanto prejuízo, pois eram parcerias, o que é essencial. E mesmo um disco não vendendo tanto, sempre considero que é uma chance de sair nos veículos, é catálogo, espólio.

E sim, o site, os shows que estamos começando a fazer, são uma volta, espero que mais forte do que estava em 2003, o ano mais devagar da gravadora. Precisava parar de lançar discos e só vender mesmo, diminuir o estoque. Não tinha mais espaço para CDs em lugar algum. Então a parada foi essencial para voltar com site, camisa nova e novas contratações também.

A_Luzerna_Falas RS Quais seriam para você os grupos instigantes e que estão na ativa, quando se trata de Rock feito no Brasil? E no exterior? Para não perder a viagem, o que está nesse momento na bandeja de discos?

A_Luzerna_Falas LP Hoje em dia no Brasil acho que tem muita gente fazendo o óbvio, isso fica bem chato. Tem duas bandas que acho que são das melhores por aqui, que é a Nação Zumbi e o Hurtmold, de São Paulo.

Revelações dos últimos anos… Tem o De Leve, aqui de Niterói. Ele faz Rap de uma maneira bem diferente e divertida. Do exterior não tenho ouvido muita coisa, mas as últimas que gostei foram At The Drive In, Mars Volta, System of a Down, Strokes. Gosto muito de uma banda da noruega chama RIFU. tocamos juntos na Alemanha e depois eles foram no nosso show em Trondhein, a cidade deles.

Ouvi umas 30 vezes essa semana o novo do Dead Fish, “Zero e Um”. Nem saiu ainda, mas como escrevi o release pra imprensa, ouvi direto. É bastante bom. Ouço meio que uma vez por semana o “singles” do Smiths. Há poucos dias ouvi o primeiro do Júpiter (Maçã). Tenho mais tocado e gravado coisas num gravadorzinho de fita cassete que ouvido outras bandas.

A_Luzerna_Falas RS Espaço Livre. Manifeste-se!

A_Luzerna_Falas LP Precisamos de espaços como esse, mais rádios comunitárias sem vícios, programas de rádio e tv nas faculdades, sempre seguindo em frente. Mais shows, festivais. Produzir mais e com mais qualidade. Não dar mole pra ninguém poder falar mal.

por Ricardo S.
Imagem: Divulgação
(Publicado originalmente em 2004)

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.